27 de janeiro de 2022 - Thiago Braga

Movimento de Defesa Profissional dos Médicos Radiologistas em Pernambuco, Uma História de Sucesso

Em várias ocasiões fui questionado sobre como conseguimos ter uma relação equilibrada nas negociações entre as diversas operadoras de planos privados de saúde e a classe da Radiologia em Pernambuco.

Para que possamos entender como chegamos aos resultados alcançados, vou fazer aqui um breve histórico contextualizando as diversas nuances que nos trouxeram à situação atual.

Segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a saúde suplementar no Brasil surgiu em 1956, quando uma policlínica criou um plano de saúde para atender funcionários da Volkswagen.

Depois dela, foram surgindo outras operadoras de saúde e seguradoras mostrando-se um mercado crescente, visto que havia um descontentamento do atendimento da saúde pública, bem como dos diversos institutos de saúde criados por empresas e por estatais.

A saúde suplementar, a partir daí, só se expandiu. Nos anos de 1960, nasceram as primeiras cooperativas de saúde do país. Por iniciativa da Associação Médica Brasileira (AMB), em 1967, foi criada a primeira Unimed, na cidade de Santos SP, que posteriormente constituiu-se em um sistema difundido por todo o país. Com esse crescimento da saúde suplementar, muitas pessoas começaram a se interessar por planos individuais, mesmo que não estivessem ligadas a uma empresa. Então, as seguradoras viram a oportunidade de começar a investir na área da Saúde – algo que de fato só foi regularizado na década de 1980.

Em 1998, com a criação da Lei n° 9.656, houve uma regulamentação da saúde suplementar, formalizando a responsabilidade contratual das operadoras, para com os seus beneficiários. Essa legislação deu uma certa ordenação ao mercado.

A partir de 1998, o setor de saúde suplementar voltou a crescer, dessa vez de maneira mais adequada. Em 2000, nasceu a ANS, que passou a regular o setor. Porém, o mercado precisou “pisar no freio” novamente em 2014, quando o país enfrentou uma grave crise econômica e social. Com o aumento do desemprego, atingindo números nunca vistos no país, muitos usuários perderam seus planos de saúde, por serem planos coletivos empresariais ou por não terem condições financeiras para arcar com os custos de um plano individual.

Falando agora um pouco sobre a realidade dos médicos radiologistas, nas décadas de 80 e 90 as operadoras de saúde perceberam que o potencial de crescimento desse mercado seria significativo. Nesse período houve uma busca incessante pelo credenciamento de diversos novos serviços, incluindo entre estes, os serviços de radiologia. Na época existia uma carência da prestação de serviços em radiologia e consequentemente houve boas negociações para os serviços de diagnóstico por imagem.

Contudo, o mercado foi se acomodando e as operadoras de saúde perceberam que a sua rede de atendimento já estava se adequando.

Quando havia a necessidade de expansão, viram que em diversas situações, principalmente nos grandes centros, existia maior oferta de serviços em radiologia do que a real demanda.

Diante dessa constatação, as operadoras de saúde perceberam que poderiam fazer adequações nos contratos com os diversos serviços de diagnóstico por imagem, em parte reduzindo o valor pago pelos serviços ou mesmo não oferecendo reajuste.

Temos relatos de colegas que diziam ser procurados por operadoras que solicitavam desconto nos valores vigentes para poder renovar o contrato, com o argumento (ameaça) de que caso não quisessem, haveria quem aceitasse aquele valor.

Numa sociedade capitalista a concorrência existiu e sempre existirá. A área de radiologia sempre transpareceu ser um mercado promissor e lucrativo, aspecto esse que, dentre outros motivos, trouxe muitos médicos a fazerem essa área e até investidores de áreas correlatas, que entenderam que seria interessante montar serviços de radiologia.

Os serviços foram proliferando, principalmente nas capitais e maiores cidades, até chegar a um ponto em que a oferta seria maior que a demanda.

Início do novo movimento da radiologia em Pernambuco – 2013

Diante desse cenário e procurando sua sobrevivência, diversos serviços passaram a fazer negociações com as operadoras de saúde, fazendo com as mesmas acordos que, embora em um primeiro momento parecessem ser satisfatórios, iriam repercutir de forma negativa no mercado da radiologia.

Essa situação fazia parte da realidade de várias regiões Brasil afora.

Percebendo um declínio no faturamento e nas tabelas adotadas, um grupo de médicos radiologistas procurou a Sociedade de Radiologia de Pernambuco (SRPE) no intuito de obter informações e orientações sobre o que poderia ser feito.

Nesse grupo havia representantes de diversos serviços de diagnóstico por imagem.

Foram feitas algumas reuniões quando foram levantados os seguintes dados:

a. Inflação do período entre 2000 e 2012 – 125,55%

b. Aumento permitido pela ANS para os planos de saúde – 170,78%

c. Reajuste das tabelas dos planos de saúde nesse período – 0%

Todos percebiam que aquela situação seria insuportável e que caso não fosse tomada alguma atitude, haveria o fechamento de diversos serviços, bem como comprometimento de diversos postos de trabalho.

Já havíamos tentado nos organizar de alguma forma para tentar contrapor os contratos leoninos oferecidos pelas operadoras de saúde, mas sempre esbarrávamos no entrave onde poderíamos ser identificados como um cartel e consequentemente sofrermos sérias sanções jurídicas e do CADE.

Parecia que estaríamos sem saída, quando tivemos conhecimento de um movimento de defesa profissional da categoria médica, puxado pelo Sindicato dos Médicos de Pernambuco, na pessoa do nosso mentor Dr. Mário Fernando Lins, já desde àquela época, Presidente da Comissão Estadual de Honorários Médicos de PE (CEHM-PE).

Esta entidade tinha ainda na sua formação o Conselho Regional de Medicina de Pernambuco, a Associação Médica de Pernambuco e algumas sociedades médicas de classe.

A CEHM-PE vinha tendo essas negociações diretamente com as Diretorias das operadoras de saúde, representando os médicos (Pessoa Física), os quais não poderiam sofrer sanções jurídicas ou mesmo serem enquadrados como cartel, visto que estavam exercendo um direito legítimo da categoria de lutar por melhores condições de trabalho e remuneração.

Tivemos conhecimento de algumas negociações favoráveis aos médicos pediatras, dentre outros especialistas.

A Sociedade de Radiologia de Pernambuco se reuniu com o presidente e os membros da comissão de honorários e solicitou orientação para as negociações dessa categoria.

A SRPE já tinha a sua Diretoria de Defesa Profissional, que prontamente se inteirou de como funcionava o movimento e trouxe o modelo de negociação para a categoria.

Segue agora um breve histórico de como funciona esse modelo da comissão de honorários médicos e em sequência os benefícios alcançados para a categoria dos médicos Radiologistas de Pernambuco.

Etapas:

I. O Sindicato dos médicos convoca uma Assembleia Geral Extraordinária (AGE) da categoria, através de edital publicado em jornal de grande circulação, conforme reza seu estatuto

II. Os diretores técnicos assinam carta solidária*

III. Declaração solidária da sociedade de especialidade**

IV. A CEHM envia ofícios comunicando resultados das deliberações da AGE, com prazo para resposta e data de próxima AGE

V. A CEHM aguarda respostas dos ofícios enviados no prazo estipulado

VI. Avaliação das propostas* em nova AGE *importante: análise das propostas por um profissional com formação em finanças e conhecimento da CBHPM ou tabelas próprias das Operadoras de Planos de Saúde (OPS)

VII. Início do moviment o legítimo da categoria – ao abrigo da Constituição Federal (CF) e do Código de Ética Médica (CEM)

VIII. Negociações

IX. Resultados avaliados em nova AGE da categoria.

Início dos movimentos em defesa da nossa categoria (Radiologistas): 2013

Temos como um dos pilares do movimento médico de defesa profissional, tentar ao máximo negociar de forma pacífica, objetivando sempre entrar em acordo para evitar o conflito.

Porém, caso o conflito seja inevitável, é importante tentarmos resolver os impasses: uma operadora por vez!

A partir de 2013 foram realizadas algumas ações em decorrência de dificuldades impostas pelas operadoras no decorrer das negociações.

Houve a necessidade de suspensão dos atendimentos a diversas operadoras, sempre, uma de cada vez.

Para tanto, fazíamos sempre um aviso prévio de que aquilo poderia ocorrer, salvaguardando o atendimento a pacientes de urgência, emergência, hemoterapia, hemodiálise, oncológicos, pacientes internados e afins.

Inicialmente as operadoras não acharam que iríamos chegar ao ponto de realizar a suspensão nos atendimentos eletivos. E por isso até se negaram a negociar.

Com o início das paralisações, foram colocados vários outdoors e outbus na cidade, artigos em jornais de grande circulação e ainda chamadas diárias na rádio de maior audiência da cidade explicando aos usuários o porquê da suspensão do atendimento à determinada operadora.

 

Legenda: Exemplo de outdoor colocado em Recife

Com essas ações, fomos procurados pelas operadoras para sentar à mesa de negociação e chegar a um acordo justo.

Nos anos de 2013 e 2014 houve alguns embates, inclusive com processos judiciais das operadoras contra clínicas radiológicas, mas que foram todos retirados, visto que perceberam que não eram as clínicas que estavam suspendendo o atendimento, mas sim os médicos (pessoa física), devidamente representados pelo Sindicato dos Médicos de Pernambuco, através da Comissão Estadual de Honorários Médicos.

Como resultado inicial, tivemos no ano de 2013 cerca de 25% de reajuste em praticamente todas as áreas de atuação em diagnóstico por imagem. O acumulado até 2017 foi algo em torno de 60% de reajustes.

Desde então, temos tido, na sua grande maioria, negociações justas para a categoria, com a reposição dos índices inflacionários (IPCA). Salientamos que o ano de 2020 foi atípico, devido a pandemia.

Diante do exposto, gostaria de deixar a mensagem que, para que possamos ser valorizados por aqueles que nos remuneram, temos que nos unir para assim termos voz em temas que tanto repercutem sobre nossas vidas.

 

Álvaro Campos
Médico Radiologista;
Diretor de Defesa Profissional da SRPE

Diretor do Sindicato dos Médicos de PE
Membro da Comissão de Defesa Profissional do CBR

Membro da Comissão de Honorários Médicos de PE