A expressão “honorário”, em sua conceituação simples, é um termo genérico usado para indicar a remuneração de um profissional liberal pelo serviço prestado. Honorário médico, por sua vez, é o valor financeiro relativo ao trabalho prestado pelo profissional da área médica a seu paciente. Em modelo de remuneração, fee for service também designa pagamento por serviço cuja remuneração, em conta aberta, vem separado das demais despesas médicas assistenciais.
Nesse sentido, a Lei nº 13.003/2014 completará uma década em junho de 2024 e foi promulgada com a proposta de tornar obrigatória a existência de contratos escritos entre as operadoras de planos de saúde e seus prestadores de serviços. Referido diploma legal alterou a Lei 9.656/98, inserindo regras contratuais no artigo 17-A da Lei de Planos.
Entre as principais alterações introduzidas no artigo 17-A, destacamos a que estabeleceu que os contratos escritos deverão ter o objeto e a natureza do contrato, com descrição de todos os serviços e a definição dos valores contratados, dos critérios, da forma e da periodicidade do reajuste e dos prazos e procedimentos para faturamento e pagamento dos serviços prestados.
Por outro lado, a questão não é nova e já era objeto de debate por força da Resolução Normativa ANS nº 42, de 4 de julho de 2003 e da Resolução Normativa ANS nº 71, de 17 de março de 2004, que traziam os requisitos mínimos para a celebração de instrumentos jurídicos entre as operadoras de planos de assistência à saúde e prestadores de serviços hospitalares. Também na mesma linha, a Instrução Normativa ANS nº 49, de 17 de maio de 2012, disciplinava as formas de reajuste dos contratos.
Nada obstante a existência de um conceito e a lei que impõe a obrigatoriedade de contrato escrito para o pagamento pelos serviços médicos prestados, não é pequena a luta dos profissionais da área médica em receber regularmente seus honorários. Soma-se a isso a ausência de aplicação de reajustes, a arbitrariedade das glosas, a imposição de juntas médicas de duvidosa postura e os atrasos perpetrados pelos tomadores de serviço para remunerar de forma digna esse profissional.
Como consequência, uma consulta médica, fixada em 100 ch’s (coeficiente de honorários) na tabela AMB de 1992, deveria custar, se corretamente atualizada pelo IGPM aos dias de hoje, o valor de R$ 447,00 (quatrocentos e quarenta e sete reais). Alguns procedimentos e exames médicos, considerando a ausência sistemática de reajuste pelas operadoras ao longo dos anos, são remunerados em menos de 10% daquilo que de fato deveriam valer.
Como essa equação ficou tão desigual? É possível reverter esse quadro?
Por certo estamos falando sobre a saúde suplementar, que corresponde a um terço de todo o volume financeiro que envolve o sistema de saúde em nosso país. Os gastos no setor das operadoras de planos de saúde e prestadores de serviços consomem, anualmente, 3% de todo o Produto Interno Bruto, algo próximo de 200 bilhões de reais.
O tratamento dispensado pelas operadoras ao longo dos anos não condiz com os princípios da lealdade, boa-fé objetiva, segurança jurídica e equidade e precisam ser revistos, de maneira urgente. As operadoras, detentoras do controle da remuneração, exercem seu poder de monopsônio e impõem a forma e o valor com que irão remunerar os prestadores, desconsiderando preceitos legais do ordenamento jurídico e princípios basilares da atividade contratual.
Por certo que as entidades de classe, aí incluídos os conselhos, associações e sindicatos têm e deverão exercer o papel de intermediadores, de maneira regionalizada e local. Alguns poderão sugerir que o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) dirá que essa medida configura cartel. Entretanto, já decidiram os tribunais, por exemplo, que a existência de uma tabela de honorários não é suficiente para constituir uma ofensa à ordem econômica e que é imprescindível que haja uma imposição ou fixação de preços com consequências negativas para os concorrentes, para que se configure uma infração. O que não é o caso.
Repor valores defasados, inclusive com ações revisionais, está longe de configurar qualquer modalidade de cartelização na área da saúde. Vale dizer: a recomendação de honorários, sem caráter impositivo, não constitui uma violação das normas de concorrência econômica. Ainda segundo os tribunais, o uso da tabela de honorários médicos como mera referência de valores, inclusive por laboratórios, sem obrigatoriedade, vinculação ou sanção, não é suficiente para caracterizar ofensa à ordem econômica.
A imposição de preços com o monopólio da remuneração controlada pelas operadoras e a ausência sistemática de reajustes precisam ser questionadas, de maneira urgente. Tabelas sugestivas de valores, com poder compensatório e sem imposição, podem e devem ser estimuladas pelas entidades de classe. A via judicial tende a equilibrar as forças. Unidos, os profissionais da área médica serão sempre mais fortes.
Dr. Valério Ribeiro
Jurídico do CBR
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