Antes do padrão TISS (Troca de Informação da Saúde Suplementar), era muito difícil e inviável financeiramente conciliar exame a exame os demonstrativos de pagamento e glosas. A começar pelo simples fato de que muitas operadoras não davam este tipo de informação ou, quando enviavam, a informação não era completa, impossibilitando assim a conciliação sem algum nível de interpretação ou risco de haver baixa em um atendimento errado.
Tudo isso perece muito inocente e burocrático, mas, quando analisamos a questão friamente, percebemos que as clínicas não recebem 100%, ou algo próximo disso, do que fazem de exames.
No quadro, fica claro que há várias etapas em que podem acontecer perdas e que se, não houver um processo bem desenhado e implantado para garantir a rastreabilidade dos exames feitos, perderemos, em algum momento, este dinheiro sem perceber.
Durante muitos anos, ouvimos de clínicas no Brasil inteiro que existem valores de glosas muito baixos ou inexistentes, mas os gestores esquecem de que não estamos falando somente da glosa que parte de um demonstrativo recebido das operadoras. Temos várias etapas do processo que podem gerar perdas mesmo antes da cobrança chegar à operadora de saúde.
Deparamo-nos com uma situação que mostrou claramente isso. Tínhamos saldos de contas a receber altos com uma operadora e, quando os cobramos, fomos informados de que não havia qualquer saldo a pagar no sistema dela, que estávamos errados, e pediu para provarmos guia a guia, exame a exame, que ela devia isso para a clínica. Ela sabia que não tínhamos este controle, porque os demonstrativos desta operadora não tinham padrão e eram disponibilizados em arquivo no formato PDF.
Como éramos grandes, conseguimos obter os demonstrativos dos dois anos anteriores e reconciliar tudo. O fato é que conseguimos recuperar muito dinheiro e a resposta que recebemos da operadora de saúde foi de que as guias não eram processadas e que deviam ter se perdido no processo.
Depois disso, começamos a olhar todas as operadoras e percebemos que o fato se repetia. Com isso, entendemos a necessidade de conciliar 100% dos exames, mas também compreendemos que fazer isso manualmente era inviável financeiramente devido à quantidade de funcionários que deveríamos ter no setor responsável.
O padrão TISS 3.02, em sua última versão, obriga as operadoras de saúde a enviar aos prestadores os demonstrativos em formato XML, possibilitando, assim, uma conciliação automatizada e a garantia de que a clínica saberá quais exames são realizados e quanto é recebido.
A resistência das operadoras de saúde em disponibilizar estes arquivos tem sido grande porque estas guias não processadas acabam por beneficiá-las. Quando falamos isso na reunião do Comitê de Padronização das Informações em Saúde Suplementar (COPISS) da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), as operadoras argumentaram que têm oferecido aos prestadores os demonstrativos em XML, mas que poucos os têm solicitado.
Assim, recomendamos que peçam seus demonstrativos e atualizem os sistemas RIS de suas clínicas para que este processo seja automatizado. No caso das operadoras de saúde que negam ou entregam fora do padrão, denunciem-nas à ANS. Elas já deveriam ter começado a enviar os demonstrativos desde 31 de agosto de 2014 na versão 03.02, que já traz as melhorias citadas.
Vale a pena lembrar que a ANS, em reunião do Grupo Técnico da Lei 13.003/14 ocorrida no último dia 15 de fevereiro, exibiu a informação que de janeiro de 2015 a setembro de 2016 foram gastos R$ 11,3 bilhões em glosas, 6,69% de tudo o que foi atendido na Saúde Suplementar no Brasil no período.