23 de setembro de 2020 - milena

As mulheres podem com segurança adiar o rastreamento pela COVID-19?

Várias recomendações sobre o manejo do rastreamento e diagnóstico do câncer de mama durante a pandemia de COVID-19 foram propostas por diversas sociedades médicas e instituições ao redor do mundo. O objetivo sempre foi equilibrar os benefícios do diagnóstico de uma doença que pode levar a morte quando não diagnosticada e tratada adequadamente, com o potencial risco de exposição, disseminação ou até morte pelo COVID-19.

O novo e desconcertante enigma “risco versus benefício” considera o grau de suspeição da paciente ter câncer de mama e, adicionalmente, a importância da informação obtida com o método de imagem para a decisão clínica. Dessa forma, mulheres sintomáticas (nódulo palpável, fluxo papilar suspeito, entre outros) ou com achados suspeitos em exame prévios (BI-RADS® 4 ou 5), em estadiamento locoregional ou sistêmico para câncer de mama ou em avaliação de resposta após a quimioterapia neoadjuvante devem prosseguir a investigação. As biópsias percutâneas de achados suspeitos e as marcações pré-cirúrgicas também devem ser continuadas. Essa decisão, sempre que possível, deve ser em conjunto com o médico solicitante, que tem um conhecimento mais adequado dos fatores de risco clínicos da paciente em relação ao COVID-19.

O grande dilema são as pacientes que não são consideradas urgentes: mulheres que estão realizando o controle de achados provavelmente benignos (BI-RADS® 3) e, principalmente, as mulheres assintomáticas que estão realizando o rastreamento, com risco habitual ou mesmo as de alto risco para o câncer de mama. O questionamento é: trazemos essas pacientes até a clínica e geramos um potencial risco de exposição e contaminação a ela, aos técnicos e tecnólogos, a equipe de apoio e aos radiologistas para um exame que dificilmente resultará em um câncer de mama? Essa resposta é difícil e complexa. A maioria das diretrizes ainda recomenda postergar esses exames. Mas o problema é que o radiologista mamário sempre trabalhou para atender às necessidades imediatas das pacientes, amenizar seus medos e agilizar seus cuidados. Como é desconcertante agora sermos confrontados com uma nova visão da equação de risco versus benefício.

Mas até quanto podemos adiar esses exames com segurança? Talvez essa resposta não exista. Pois não existe segurança quando adiamos a detecção de um câncer que pode ser curável em fase inicial. Por isso o planejamento do retorno às atividades para a realização dos exames eletivos deve levar em consideração o estado epidemiológico de cada região. Em locais onde o número de casos de COVID ainda esteja alto ou em ascensão,  o que podemos é iniciar o planejamento de um retorno às atividades para revertemos o mais rápido possível essa situação: fazer uma lista de todas as pacientes canceladas durante a pandemia, para que sejam as primeiras a serem agendadas; dentre as pacientes que foram postergadas, fazer uma lista de prioridades de atendimento: inicialmente as mulheres em rastreamento por alto risco, seguidas pelas pacientes em controle de achados BI-RADS® 3 e após as mulheres em rastreamento com risco habitual de câncer de mama. Outras medidas como planejamento de turnos adicionais de trabalho em horários intermediários ou noturnos, assim como nos finais de semana, podem ajudar. Mas é evidente que em um país onde o acesso a exames sempre foi difícil, mesmo em tempos pré-pandemia, com certeza não será uma tarefa fácil reverter essa situação.

Por outro lado, nas regiões onde o pico da pandemia já passou e os novos casos estão estabilizados, nos quais está ocorrendo uma flexibilização das medidas de isolamento social, a realização dos exames eletivos já pode ser considerada. Mas para isso é necessário que todas as recomendações de segurança descritas nas “Recomendações gerais de prevenção de infecção pelo COVID-19 para clínicas e serviços hospitalares de diagnóstico por imagem”, publicadas pelo Colégio Brasileiro de Radiologia (disponível no site: www.cbr.org.br), assim como na Nota Técnica “Orientações para a prevenção da transmissão de COVID-19 dentro dos serviços de saúde (GVIMS/GGTES/ANVISA Nº 07/2020), publicadas pela ANVISA, sejam cumpridas para garantir segurança aos pacientes e aos profissionais de saúde. Importante ressaltar que a decisão final de fazer um exame eletivo deve ocorrer sempre que o médico e a paciente concluírem que a equação “risco versus benefício” esteja apropriada, porém tentando não extrapolar um prazo máximo de intervalo entre os exames de 18 meses.

Enfim, o Brasil é um país continental e as medidas e estratégias adotadas em um serviço ou hospital podem depender da organização individual, dos recursos das instituições e da situação epidemiológica de cada região, podendo não ser as mesmas para outros locais. Mas, assim como ocorreu em outros países, voltaremos à “normalidade”. E que isso seja o mais breve possível.

 

Comissão de Mamografia, CBR